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Mandou elrey abrir a terra onde isto passou e foi achado um grande haver, que a elrey foi de grande admiração; e para pagar ao letrado tão bom conselho como tinha dado, em especial tiral-o de uma duvida tamanha, lhe concedeu uma boa parte d'aquelle haver, e outra parte mandou dar ao barbeiro com que se auctorisasse em estado.

(Trancoso, Contos e Historias, Parte III, conto III.)




169. O ACHADO DA BOLSA

Havia um mercador muito rico, e assim como cada dia se lhe iam acrecentando suas riquezas, assim n'elle se lhe ia multiplicando tanta avareza, que em outra cousa não trazia o sentido senão em ajuntar dinheiro. Este estando um dia vendendo suas mercadorias, tomou quatrocentos cruzados em ouro, que havia vendido, e deitou-os em uma bolsa, e despois de recolher seu fato se foi para sua casa enthesourar. Indo pelo caminho fazendo suas contas com a imaginação, lhe acertou a cahir a bolsa, e até que chegou a casa a não achou menos. Esteve para perder o juizo juntamente com a bolsa. Com grande dôr e paixão se foi ao Duque, que era senhor d'aquella cidade, e lhe pediu que mandasse sua excellencia em seu nome apregoar que quem achasse uma bolsa com quatrocentos cruzados em ouro, que os trouxesse diante d'elle, que lhe daria quarenta cruzados de achado. Foi dado o pregão pela cidade, e sendo ouvido de todos, chegou a ouvidos de quem tinha achado a bolsa, que era uma mulher viuva, muito pobre e virtuosa. E ouvindo dizer, que davam quarenta cruzados de achado foy mui leda, entendendo que ficar com a bolsa seria infernar sua alma. Assim com esta determinação se foi diante do Duque e lhe poz em sua mão a bolsa que havia achado assim e da