Tertuliano desenvolve estes mythos indo-europeus em considerações abstractas: «Eu lanço os olhos sobre as manifestações do poder divino: o dia morre para dar logar á noite, e sepulta-se por toda a parte nas trevas. O ornamento do universo occulta-se sob os funereos véos: tudo é sombrio, silencioso, consternado; por toda a parte a interrupção dos trabalhos! A natureza enluctou-se para chorar a perda da luz… Mas eis que ella revive para todo o universo, com a sua magnificencia e com a sua pompa nupcial, sempre a mesma, sempre inteira, immolando a morte, isto é, a noite, rasgando a sua mortalha, isto é, as trevas, e sobrevivendo a ella, até que a noite volte outra vez e traga comsigo os lugubres aprestos. Então accendem-se as estrellas, que a claridade da manhã extinguira. Os planetas, um momento exilados pelo dia, são trazidos em triumpho… Sobre a terra, a mesma lei que no céo; depois de terem sido fanadas, as flôres reapparecem com suas côres, os campos cobrem-se uma segunda vez de verdura. O que é, pois, esta perpetua revolução da natureza? Um testemunho da ressurreição dos mortos.»[1]

Podem-se aproximar d’esta passagens analogas dos Vedas; então se notará que a concepção dos phenomenos é a mesma, havendo apenas uma interpretação allegorica sobre a impressão subjectiva. Nos espiritos mais elevados, a imagem poetica incide inconscientemente sobre esta mesma ordem de comparações, tendo já perdido o caracter de realidade mythica; em Metastasio, o fino poeta cesareo do seculo XVIII, lê-se este esboço do mytho primitivo:

Primavera, giuventu dell’anno,

Giuventu, primavera della vita.

  1. De ressurrect. carnis, cap. XII.