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CONTOS E PHANTASIAS
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Imaginam que me enganam, os queridos velhinhos!

Elles que gostam tanto do cantinho do fogão, onde conversam, e se recordam de tudo que passou, fingem um subito e inexplicavel desejo de distrações mundanas.

Eu sigo-os com um sorriso malicioso que ás vezes os assusta.

Sabes as minhas ideias, não é verdade?

Que garantias de futuro me daria a mim um marido apanhado a laço á luz dos lustres dourados, em uma sala de baile frivola e banal?

Não é ahi que eu encontrarei de certo o noivo da minha alma!

Porque é que se não poderá alliar a poesia do coração com os deveres da realidade? Não entendo isto!

Pois só serão deliciosos os amores vedados?

A mim parece-me que a vida com o seu cortejo de dores, de deveres, de sacrificios, de affectos, a vida com a sua manhã purpurea e gorgeada, com o seu meio dia luminoso em que rompe em ondas crystallinas a musica triumphante dos vinte annos, com a sua tarde melancolica d’uma doçura indefinida e dubia, com a sua noite emfim, noite estrellada e calma, em que esmorecem e expiram todos os rumores da terra, é como que um poema