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CONTOS E PHANTASIAS

saudades olho para o retrato d’ella!... Fômos tão amigas!

E callava-se baixando os olhos, receiosa de que a vissem contemplar com demasiado enlevo os dias que já não podiam voltar.

Todos aquelles retratos tinham uma historia.

Aquelle cortejo de juvenis visões louras, morenas, travêssas ou melancolicas faziam parte do passado, por isso lhes queria tanto.

Umas tinham casado, eram felizes, viviam absorvidas pelo divino egoismo da familia, todas entregues ao bem estar dos seus, aos interesses, ás alegrias, ás dôres do seu pequeno circulo de affectos.

Outras tinham morrido; eram as que alli nos appareciam mais pallidas, com um vago reflexo de luz febril nos olhos pasmados e pensativos.

Tinham morrido na plena florescencia do seu imaginar juvenil, levando para a cova, como levariam uma flôr ainda constellada pelos orvalhos matinaes, a dôce chymera que nenhum sôpro brutal lhes havia desfeito.

Fecharam os olhos cercados por todas as apparições fulgidas, que envolvem a mocidade como n’um circulo de estrellas, e foram despertar — quem sabe! n’outras regiões de que ninguem ainda voltou, do sonho feliz que haviam começado na terra.