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CONTOS E PHANTASIAS

tão doce que lembrava o desabrochar de um lyrio.

Não estava muito em casa, tinha que fazer fóra, andava ganhando a vida de elegancias e de confortos, que viviam inconscientes, innocentemente egoistas, os seus dous frageis amores — a mulher e a filha.

Mas quando elle estava, que festa!

Bertha, ora ennovellada aos pés da mãe, nas felpas avelludadas do tapete, e com os grandes olhos curiosos fitos nos d’ella, ora folheando um grande livro de imagens — como o teu, minha Naly — , ora empoleirada no espaldar da larga poltrona onde o pae estava sentado, e passando-lhe a pequenina mão crestada pela cabelladura revolta e crespa, Bertha era a mais feliz das creaturinhas do bom Deus!

Era um gosto vel-os alli a todos tres, na intimidade d’aquelle viver de familia!

Margarida, ao principio, trabalhava sempre; n’uns dias, um vestidinho para a sua querida filha, n’outros dias, um pequeno objecto galante e mimoso para o escriptorio do seu marido; de tempos a tempos um enxoval para uma pobresinha, um enxoval muito aceiado, que Bertha dobrava e desdobrava, que servia de thema para longas interrogações, e como que iniciação da creança na doce caridade de sua mãe.