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CONTOS E PHANTASIAS

O que elle aqui não diz, mas o que mais d’uma vez lhe foge dos labios e dos biccos da penna, n’um grito doloroso e dilacerante de agonia prophetica, é que a morte implacavel ha de vir colhel-o no instante em que elle já extenuado de tantas luctas ia tocar a méta do seu desejar infrene.

O que torna mais digno de um curioso estudo a indole litteraria de Balsac é a revelação feita pelos seus amigos e confirmada por elle proprio, da excessiva difficuldade, que o romancista encontrava para achar um molde adequado ao seu pensamento tão profundo e complexo.

A palavra trahia-o a cada instante, a lingua, como a Galatheia da fabula, recusava-se a ceder ás febris solicitações do seu pensamento, fugia-lhe ondeante e caprichosa, e elle impotente, desesperado, ardendo em febre, luctava noites e noites com a fórma tyrannica que se não queria deixar domar!

«N’essas batalhas nocturnas, — diz Théophile Gauthier, no admiravel estudo que consagrou a Balsac, — e das quaes o escriptor acabava de manhã despedaçado, mas vencedor, quando o lume do fogão se apagava e a atmosphera arrefecia, a cabeça d’elle exhalava fumo, e do seu corpo sahia uma especie de nevoeiro vizivel como do corpo dos cavallos em tempo de inverno.