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CONTOS CARIOCAS


Acordei de repente, e, para saber onde
Me achava, olhei ao longe e vi o mar, e logo
Pensei commigo: — Bom! já estou em Botafogo. —
Adormeci de novo, e quatro sacalões
Fizeram-me acordar... no largo dos Leões!
Sim, senhor, foi bem boa:
O que me parecera o mar, era a lagôa
De Rodrigo de Freitas!
O marido que eu sou — um marido ás direitas —
Na alcova conjugal entrou ás onze e meia!
Agora vejam lá qual foi a minha ceia:
Minha mulher, de pé, as faces incendidas,
Nos olhos o signal das lagrimas vertidas,
Quer saber de onde e como aquellas horas venho,
E me accusa, a gritar, de culpas que não tenho!
— Onde esteve o senhor mettido até esta hora? —
— Biloca, ouve, meu bem: a causa da demora... —
— Não diga, que não creio! — O’ Biloquinha,
[ao menos
Não grites, para não despertar os pequenos! —
Emfim, passo por alto os longos pormenores
Do conflicto, — eu vestido, ella em trajes menores;
Eu calmo, ella furiosa, e, n’um ciume absurdo
Um barulho a fazer de ensurdecer um surdo!
A’s’ cinco da manhã dormiamos serenos,
Biloca, eu e os pequenos.

Mulher que por ciumenta o marido não poupa,
Tem o habito máo de examinar-lhe a roupa,