a capota empoeirada sob o sudário do luar. Depois, rodou devagar, como se tivesse uma alma e estivesse a disfarçar uma ação feia. Ao chegar ao escuro beco de Bragança parou, a portinhola abriu-se, uma sombra golfou, então aí a berlinda precipitou a marcha. Deus! que seria aquilo? Um crime? uma extravagância? A passeata de algum crente agonizando, que tivesse feito a promessa de arrastar a sua agonia aos pés de todos os corpos de Jesus expostos? Mas a sombra? Eu amo o horror das coisas inacreditáveis. Meti-me quase a correr pelo beco. No meu cérebro havia um escachoar de idéias...

Não encontrei a sombra, o vulto que eu vira sair do carro. E a procurá-la, de rua em rua, com a face a queimar, fui até a igreja do Rosário. Como? Não sei. O sangue latejava-me nas têmporas, um suor viscoso molhava-me a palma das mãos. Quando dei por mim, tinha diante de mim a velha igreja, e ao canto esquerdo do templo, exatamente igual, tal qual, a velha berlinda. Coincidência... Há desses encontros de gente que nunca se falará, em reuniões dominadas pelo vício. Não filosofei, porém. Fui ao cocheiro, querendo saber. - "Olá, camarada, desocupado? "- "Não", respondeu ele seco. - "Pago bem." - "Não posso, já disse." - "Tem alguém ai então?" O cocheiro cuspiu para o lado. "Ó seu, vá se pondo fora, se não quer que lhe aconteça alguma." Fiquei sem palavra e ele tocou.

Mas o desejo de conhecer a razão daquelas paradas à