CAPITULO III
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identica, se bem que sem accordo previo, pois que fôra tão inopinado o fallecimento de Dom João VI. «É optimo que o principe de Metternich haja comprehendido tão integralmente a importancia de convencer o infante Dom Miguel a prolongar sua estada em Vienna», escrevia Canning a Sir William A' Court a 27 de Maio de 1826[1]. A circular da chancellaria austriaca aos seus representantes no estrangeiro, reconhecendo os direitos de Dom Pedro ao throno de Portugal, fôra, na expressão de Canning, que não era levado a exagerar quando se tratava de outrem, «o facho que illuminou e guiou os passos de todos os gabinetes n'este negocio, detendo as desordens que uma indecisão por parte das potencias poderia ter provocado em Portugal »[2]. A Russia mesma não deixaria de pôr-se em igual diapasão desde que o accordo do Tzar Nicoláo e seu ministro Nesselrode com as grandes potencias se esboçava com relação ás questões do Oriente. De minimis non curat prætor... Constantinopla e não a legitimidade portugueza constituia a grande preoccupação do governo de São Petersburgo.

O principe de Metternich não procedia muito provavelmente com a duplicidade que se lhe quiz attribuir: se quizesse ser tão velhaco como se pensa, teria agido de modo menos complicado e tambem menos arriscado. É verdade que recusara acceder ao marquez de Rezende quando este lhe propuzera acceitar uma nota com o pedido de formal reconhecimento dos direitos do seu soberano, o Imperador do Brazil, á corôa dos seus maiores. Dado o alcance de semelhantes titulos, o paladino por excellencia do principio da legitimidade considerava uma tal declaração acto novo em diplomacia, podendo até fazer crer na existencia de duvidas ácerca de uma successão como aquella, de direito e de facto. Ao mesmo tempo, porem, não trepidara o chanceller em reprehender asperamente o enviado hespanhol que o increpava com insolencia por conservar Dom Miguel prisioneiro. A aspereza em Metternich nunca excluia o bom tom. Foi com as seguintes palavras e um sorriso malicioso que replicou ao altivo Acosta, o qual emmudeceu: «Se a vossa incompetencia em julgar com justeza dos cambiantes da lingua franceza não fosse aqui tão notoria, sei bem a resposta que vos deveria dar; mas fiquemos por aqui, pois que deixariamos de comprehender-nos».[3]

Queria Metternich preparar a volta de Dom Miguel, preven-

  1. B. R. O., F. O.
  2. Marquez de Rezende, ob. cit.
  3. Marquez de Rezende, ob, cit.