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DOM PEDRO E DOM MIGUEL

xador britannico calculava ser inevitavel um levantamento se antes da chegada do infante não tivessem sido concedidas algumas garantias, tanto ás liberdades da nação como á segurança pessoal dos nacionaes. A Dom Pedro cabia conceder taes garantias, e o meio que parecia mais simples e melhor indicado era o de servir-se do instrumento das antigas Côrtes do reino, cahidas em desuso mas não extinctas. Era portanto a desejar, no juizo do diplomata inglez, que, qualquer que viesse a ser sua decisão final, o Imperador conservasse a corôa tempo bastante para permittir aos Trez Estados que se reunissem sob sua auctoridade (in his name), não sómente para ratificar os arranjos relativos á successão da coroa como para introduzir as reformas e, uma vez concordadas, modelar as novas instituições ás quaes tinha que se adaptar o futuro governo do paiz. «Se se não offerecer um penhor qualquer d'esta especie em opposição ao temperamento violento e aos principios arbitrarios do infante Dom Miguel, receio que o seu regresso, quer como membro da regencia, como regente ou como rei, seja o signal de perturbações e de tumultos. Sua exclusão por mais tempo de toda participação no governo, determinaria provavelmente o mesmo resultado, se bem que n'este ultimo caso fossem outros os agentes da desordem»[1].

Em 1824, depois da Abrilada, fallara-se em Lisboa em solicitar das Côrtes uma lei de exclusão de Dom Miguel da successão da corôa, a que nem a Inglaterra assentiu, embora olhando de esguelha para a conferencia dos embaixadores em Pariz, na qual Pozzo di Borgo, despeitado com a possibilidade de instituições representativas em Portugal, argumentou que «a ordem estabelecida da successão n'um Estado monarchico não podia ser mudada sem offensa ao direito publico da Europa». Nem a Austria apoiou este modo de ver, mas pelo facto da revolta de Dom Pedro contra a mãi patria, Dom Miguel era n'esse momento considerado o herdeiro do throno portuguez[2].

Dom Pedro quereria bem dar arrhas do seu liberalismo, mas queria agir por si, sem o concurso das Côrtes. A opportunidade do seu acto não reuniu porem todos os suffragios. José Liberato Freire de Carvalho, cujo ardor constitucional não pode ser posto em duvida, pensa que se o Imperador não houvesse outorgado a Carta de 1826, o partido absolutista não teria tido a coragem de levantar a cabeça e contestar sua

  1. Despacho de A' Cort a Canning de 2 de Junho de 1826, B. R. O., F. O.
  2. Harold Temperley, Canning and the Conferences of the Four Allied Governments at Paris, 1823-1826, na American Historical Review de Outubro de 1921.