CAPITULO IV
43

legitimidade. Dom Pedro andou pois mal porque se enganou. Apenas aquelle veterano da imprensa politica, monge transformado em revolucionario, esquecia na sua minguada sympathia por Dom Pedro e pelo seu gesto, preferindo a este a iniciativa popular, que toda a familia se julgava com titulos á corôa, mesmo a infanta regente.

O que Dom Pedro sempre mais acariciara era o plano de se não deixar atar as mãos. Já antes do fallecimento de Dom João VI o ministro d'Austria no Rio de Janeiro, barão de Mareschal, escrevia a Metternich[1] que «S. A. Real (a Austria ainda não reconhecera o Imperio) preferirá conservar Portugal para si emquanto puder; mas como procura dissimular este desejo, fará crer que apoia os direitos de sua mãi e de seu irmão, como meio seguro de trazer a questão suspensa sem ser forçado a manifestar-se». Logo porem que recebeu a noticia do obito d'El-Rei, a 24 d'Abril de 1826, entrou a desmascarar as baterias.

Mareschal correu de seguida ao paço de São Christovão. O marquez de Paranaguá, que lá se achava e era bom aulico, era de parecer que Dom Pedro não podia lesar os direitos dos seus filhos. Quanto ao Imperador, tomou Mareschal por testemunha de que sempre quizera renunciar a tal successão, mas que sua posição se tornara extremamente difficil, porque de um lado os brazileiros o incriminariam se tal não fizesse, ao passo que do outro lado, se o fizesse, se veria abandonado pelos portuguezes que tinham até então acompanhado sua fortuna na esperança de vel-o um dia cingir a corôa dos seus maiores. É verdade que a Constituição brazileira vedava toda união ou federação de paizes, mas o caso ahi era diverso, tratando-se de duas corôas a serem reunidas sobre a mesma fronte. Imperador e ministro pareciam portanto avessos a qualquer recusa e Mareschal informa que foi a seu conselho que Dom Pedro não mandou publicar na Gazeta official, juntamente com o necrologio paterno, uma exposição dos direitos do soberano do Brazil ao throno de Portugal.

No conselho d'Estado, a 25 d'Abril, discutiram-se os meios da preservação, se possivel, das duas corôas. Dom Pedro estava decidido a tanto, outorgando a Carta e mantendo a independencia reciproca das duas nações. Paranaguá achava que o Brazil andava por tal forma agitado que o Imperador poderia perdel-o e que n'esta eventualidade lhe ficaria Portugal: Ma-

  1. Despacho de 13 de Fevereiro de 1820, no K, a. K. Hans., Hof, und Staatsarchiv de Vienna.