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DOM PEDRO E DOM MIGUEL

desmanchar e fallava em demittir-se, procurando entretanto desculpar a Rainha, a qual não podia seguramente inspirar confiança, mas era forçada a moderar seus actos em vista do seu estado de saude, se bem que a infanta Izabel Maria pretendesse que ella exagerava a doença[1]. A medida que se restabelecesse poderia ir ficando menos razoavel ou então... quando o filho estivesse alli ao seu alcance como o instrumento de cevar seus rancores. Intelligente como era, Dona Carlota Joaquina sabia que esse instrumento lhe era indispensavel para chegar a seus fins: a primeira cousa para produzir uma explosão é a mecha.

As suspeitas da regente acalmaram-se um pouco pela continuação e, conforme sua confissão ao embaixador por occasião da audiencia para a apresentação official das condolencias de S. M. Britannica, ella adoptou um modus vivendi, entregando á mãi a plena direcção do paço, mas não transigindo quanto ás suas attribuições e reservando-se exclusivamente a decisão de tudo que se prendia com as questões politicas. A darmos fé ás queixas dos seus conselheiros, ella ia demasiado longe n'essa reserva, dando-se ares de soberana. O Dr. Aguiar partira para o Rio de Janeiro no intuito de persuadir Dom Pedro de renunciar em favor da irmã se sua resolução imperial fosse a de abdicar a coroa real. Wellesley soube d'este projecto em Vienna, onde era embaixador, transmittindo a informação a Canning a 12 de Maio, e Porto Santo teve que o declarar exacto, quando A' Court o interpellou a respeito.

Na verdade não só as facções extremas, mas todos os partidos pretendiam tirar proveito da situação confusa que se apresentava. Os liberaes preferiam muito naturalmente Dona Izabel Maria a Dom Miguel. Havia mesmo no seu numero os que a preferiam á princezinha do Grão-Pará, promettida ao tio já antes do fallecimento de Dom João VI, porque é preciso ter em mente que a iniciativa d'esse fallado matrimonio não coube a Metternich, o qual apenas fez adoptar uma idéa que encontrou formulada e assente. A esse tempo não se tratava absolutamente da abdicação de Dom Pedro, cujo ensejo ainda se não offerecia, e aquelle casamento de familia poderia não constituir mais do que uma solução eventual para o futuro. Com o designio persistente de arredar Dom Miguel do throno na cathegoria de consorte que fosse, surgiu um momento a idéa de dar por marido a Dona Maria da Gloria o infante Dom Sebastião, filho da princeza da Beira, viuva do infante hespanhol Dom Pedro Carlos, fallecido no Rio de Janeiro.

  1. Despacho citado de 19 de Março de 1826.