CAPITULO VII
63

conhece que outros motivos são mais sabios. As suas razões acham-se perfeitamente deduzidas[1].

«Se as antigas Côrtes de Portugal fossem uma instituição tão notoria e definida que não pudesse surgir divergencia alguma de opiniões sobre a forma da sua reunião, as attribuições que lhes cabem e as limitações que devem necessariamente ser postas aos seus poderes, ou se existisse em Portugal uma auctoridade capaz de prescrever aquella forma no momento da convocação, designar aquellas attribuições e fazer respeitar aquellas limitações, com a certeza para mais de ser obedecida, não se pode negar que haveria consideravel proveito em obter, para a nova Carta elaborada por Dom Pedro, a sancção de semelhantes Côrtes, nome que remonta á installação da realeza portugueza. As Côrtes tendo-se porem sob não importa que aspecto tornado obsoletas durante mais de um seculo, a sua organização primitiva parecendo mais popular que a do Parlamento proposto por Dom Pedro, visto que as Tres Ordens do Estado se reuniam separadamente e que a da nobreza temporal se constituia por eleição e não por nomeação da corôa, deve-se porventura admittir que algum fundamento existe para a apprehensão de Dom Pedro — que a convocação d'aquellas Côrtes mais facilmente levaria á formação de uma Assembléa Constituinte do que a adopção immediata da sua Carta.

Não se pode absolutamente duvidar que, quando Luiz XVI de França foi induzido a convocar os Estados Geraes do reino, seus conselheiros imaginaram que, pelo menos com relação á natureza d'essa assembléa, ao genero das suas attribuições e extensão dos seus poderes, existia, quer um assentimento geral que impediria toda discussão sobre taes topicos, quer auctoridade bastante da parte da corôa para decidil-os a seu feitio. Não é necessario notar quanto semelhantes esperanças foram mallogradas e com que rapidez uma instituição evocada do mais intimo e sacrosanto passado da antiga monarchia assumiu novo aspecto e se tornou fatal á propria monarchia. Este exemplo e seus effeitos são bem dignos de uma seria meditação. E ha ainda outra difficuldade a encarar na convocação das Côrtes se a ellas se fizer appello em vez de adoptar a Carta Constitucional de Dom Pedro. Tal substituição, mesmo na intenção suggerida pela França de sanccionar a adopção da Constituição, seria uma infracção (departure) ás ordens do Imperador e portanto um desafio à sua auctoridade.

  1. Despacho citado de 17 de Junho de 1826.