CAPITULO VIII
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rança em favor da sua próle, não hesitou em escrever : « Sim, mas sómente para poder fixar a escolha do herdeiro de Portugal, dispondo primeiro a seu bel prazer do thesouro ».

O Imperador ainda estava na sua phase lusophoba, quando insultava a terra portugueza para se pôr ao diapasão dos patriotas brazileiros. Entendia só ceder a Portugal seu terceiro filho (quando o tivesse), reservando ao Brazil o primogenito e o segundogenito « para estar mais seguro da manutenção da dynastia na America». Em rigor não podia ceder qualquer dos filhos, porque eram brazileiros e possuiam direitos de successão ao imperio, cuja Constituição prohibia a acceitação de outra corôa mesmo temporariamente, sem previa renuncia ao throno occupado. A ninguem é dado transferir um titulo que lhe não pertence.

Ao artigo propondo que o casamento de uma das suas filhas (não tinha então herdeiro varão) com um principe portuguez não pudesse, segundo as leis do reino, invalidar o direito exclusivo da mesma princeza ou dos seus descendentes á corôa do Brazil, apressou-se o Imperador em responder — « Muito pelo contrario, ella perderá todos os seus direitos e outrotanto acontecerá com os seus successores, pois assim o exigem os nossos principios de separação de Portugal, estabelecidos por occasião da independencia ».

Queria Dom Pedro a esse tempo ter a faculdade de regular a seu talante a successão portugueza. Assim era que se o principe ou princeza que herdasse a corôa do reino viesse a fallecer sem descendencia, o herdeiro immediato não seria automaticamente installado, a saber, não subiria ao throno pela ordem natural das cousas por direito de nascimento. O Imperador interviria para nomear o successor do seu successor, porque, dizia elle, esse direito reverte para mim desde que não foi preenchido o fim de dar a Portugal uma nova dynastia, prolongamento da antiga, da mesma forma que a Carta de 1826 devia apenas ser a continuação, adaptada ás circumstancias, da velha Constituição da monarchia. Dom Affonso Henriques porem dissera ás suas Côrtes — façamos leis, e Dom Pedro IV escrevera com relação á sua Carta — apraz-me decretar[1].

  1. « Nem Clodoveu, vencedor dos Romanos e dos Gaulezes, ao estabelecer a lei salica ; nem Guilherme o conquistador, quando fez pesar o jugo das suas leis normandas sobre a Inglaterra escravisada, fallaram com mais arrogancia, ... (Ezamen de la Constitución de Don Pedro, y de los derechos del Infante Don Miguel, Paris, 1827). Escripto do ponto de vista apostolico e anti-regalista, reprovando que « os actos da religião, emanados da auctoridade suprema universalmente reconhecida, taes como bullas pontificaes e decretos dos concilios, fossem submettidos á auctoridade privada de um principe secular ». O auctor via na Carta o fundamento de uma Egreja nacional portugueza, a reviviscencia do gallicanismo.