vivos, inquietos, mais ruivos do que castanhos, nariz sensual, engrossando na ponta, labios delgados sorrindo pouco, mento quadrado, as orelhas um pouco despegadas, tudo isto lhe dava uma phisionomia desagradavel á primeira vista, phisionomia a qual o encanto da sua palavra rebus. cada dava uma certa atracção. Era forte muscularmente, no emtanto havia nelle qualquer coisa de arruinado, de abulico, de surmené. Isto é o seu retrato phisico. A sua arte está nos seus livros. Que a busquem lá os gosadores de sensa. ções perversas, os collecionadores de enormidades, do mais além do senso vulgar.

A sua Musa adeja n’aquellas páginas como una ave satanica, enchendo de espanto a alma do transeunte leitor. A sua carcassa, essa, está em Paris no cemiterio Montparnasse Dorme sob uma larga pedra em que ele se vê esculpido em vulto, enfaixado como as múmias pharaónicas. Ao alto, debruçando-se, olhos vagos, no vago infinito, o genio do Mal perscruta. E sob este uma ave fantastica de largas azas abertas, domina o rosto glabro do poeta. Perto, crescem flores. Tudo o que resta são os seus livros, algumas duzias de ossos e o monumento funebre de Charmoy. Apenas.

Baudelaire foi toda a sua vida um mystificador? Talvez Não nasceu mystificador, os outros é que o fizeram. A sua pobre alma sensitiva vingava-se d’elles com ironias, com enormidades. Fazia a loucura de caso pensado para se dar ares de ser original, como outras creaturas que encobrem o medo sob a fanfarronada da força que não tem. O seu fato e a sua arte é tudo disfarce. São disfarces as suas ironias, são disfarces as suas visões tenebrosas, as suas imagens que roçam o desequilibrio. Disfarces talvez não. Eram a defesa da sua alma, a barreira do seu espírito, a muralha com que elle delimitava o mundo.

No fundo, Baudelaire era um pobre diabo, um grande pobre diabo. Honesto, amoroso e dedicado. Visto atravez da sua obra é apenas perverso, diabolico, mau, arrepiante.