Mas que não se perturbe o vosso animo forte
Porque inquieta eu sou, e ousei pensar na morte.
De affecto e de anciedade igual medida temos,
Ou nullos um e o outro, ou um e o outro extremos.
Se é grande o meu amor, demais senhor o vêdes,
Que a par anda o receio, em minha fronte o lêdes.
Sempre que o amor é grande, as apprehensões mais breves
Transformam-se de prompto em maximos temores;
Quando é grande o receio, os affectos mais leves
Ascendem de repente aos mais grandes amores.

O REI DA PEÇA

Bem cedo é força, amor, que d'este mundo eu parta,
Bem vês, d'esta alma a luz já quasi que se aparta.
Tu viverás sem mim, sob este céu formoso,
Querida, idolatrada e sempre honesta e casta.
Depois, talvez depois, quem sabe? um novo esposo...
Um homem justo e bom...

A RAINHA DA PEÇA

Oh! basta, senhor, basta!
Seria um novo amor perfidia negra e infame.
Amaldiçoado seja o dia em que outro eu ame!
Embora justo e bom, segundo companheiro
Não n'o acceita ninguem, sem ter morto o primeiro.

HAMLET

Isto é absintho, e que absintho!

A RAINHA DA PEÇA

Poisque motivo arrasta a viuva ao casamento?
Acaso um novo amor? um nobre sentimento?
Um sordido interesse: e eu cravára no peito
De meu morto senhor a ponta de uma espada,
Cada vez que, olvidando a antiga fé jurada,
Compartisse outro ser commigo o mesmo leito.

O REI DA PEÇA

<poem> Creio bem, que pensaes o que dizeis, se creio?! Mas quanta, oh! quanta vez, se quebra a acção no meio, Nasce a resolução escrava da memoria, Producto da violencia, é curta a sua historia. A fructa emquanto verde em qualquer ramo atura Mas, sem abalo algum, tomba apenas madura. Fatalmente olvidando o que a nós nos devemos Não pagâmos jámais, a divida esquecemos. O que durante a dor parece a eternidade, Mal extincta a paixão, cessa de ser vontade. O jubilo e o martyrio, ainda os mais completos, Destruindo-se a si, destroem seus decretos. Onde o prazer mais ri, mais chora a dor pungente; Entristece a alegria, alegra-se a tristeza, Á causa mais subtil, ao mais leve accidente, E este um dom fatal da vária natureza. <poem>