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nos dez annos que faltavam, pondo-se em todo o seu vigor[1].

Estas demonstrações de benevolência e de arrependimento das passadas tyrannias, ao mesmo tempo que eram para os christãos-novos um lenitivo no meio de tantas amarguras, creavam-lhes esperanças enganosas para o futuro, fazendo-lhes crer que a intolerancia e os ódios brutaes do povo excitado pelos frades obrigariam o poder publico a protegê-los com redobrada energia. Persuadiram-se de que a opinião do vulgo, radicada pela lembrança de antigos aggravos, mantida e generalisada pela poderosa influencia do clero, poderia ser vencida pelas sans idéas da politica judiciosa que, num momento de indignação e horror, D. Manuel adoptara. Illudia-os, por certo, o desejo de não abandonarem o paiz, retidos por essa multidão de affectos que prendem o homem á terra natal. Commerciantes, industriaes, proprietarios, exercendo profissões scientificas, constituindo, emfim, a melhor parte do que hoje chamamos classe média, os seus interesses deviam pa-

  1. Provisão de 13 de março de 1507, na Hist. da Inquis. de Monteiro, P. i, L. 2, c. 43, e vertida em latim na Symmicta, vol. 31, f. 88.