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conformes com os preceitos do catholicismo podiam ser indicio de tibieza na fé, mas se elles faltavam aos officios divinos, circumstancia difficil de provar numa cidade populosa e cheia de templos, e se isso os caracterisava como judeus, o que seríam aquelles prelados e parochos que, segundo o testemunho dos procuradores dos povos, devoravam as avultadas rendas ecclesiasticas, deixando os fiéis sem missa e sem sacramentos? Acontecia fallecerem muitos conversos sem os ultimos auxilios, mas, acaso, sería raro o successo entre os christãos-velhos[1], e não se dariam então mil circumstancias que ainda se dão hoje para assim acontecer frequentes vezes entre famílias grandemente catholicas, sem

  1. Era tão frequente como hoje. Eis o que a tal respeito respondeu Fr. Francisco da Conceição, consultado sobre este e outros objectos pelos padres do concilio do Trento, desejosos de se informarem do estado da religião de Portugal: «Multi vel sine hoc sacramenlo (unctione) discedunt, vel tunc suscipiunt quum vix jam sentiant, quod nemo audet eis (est enim extremum ut putant, mortis nuncium) persuadere»: Symmicla Lusit. (vol. 2.°, f. 186). O mesmo motivo que se dava para os christaos-velhos morrerem sem extrema-uncção nao se dena para morrerem sem ella os conversos?