Página:Herculano, Alexandre, História da Origem e Estabelecimento da Inquisição em Portugal, Tomo I.pdf/259

de D. João iii em Roma. Não acharam aelle os christãos-novos favor ou misericordia. Apresentaram-se como accusadores dos réus dous habitantes de Gouveia, Richarte Henriques e um certo Barbuda, e foi tal o numero das testemunhas a favor da accusação que, apesar dos receios manifestados pelos juizes daquello villa sobre os meios de corrupção de que os christãos-novos dispunham, os conversos não encontraram bastantes malfeitores e indivíduos mal morigerados para lhes contraporem. Condemnados á morte, os tres infelizes expiraram no meio das chammas abraçados com o crucifixo e invocando o nome de Christo até o ultimo suspiro[1]. Antes, porém, do desfecho desse terrivel drama, novas e graves suspeitas se haviam suscitado contra vanos outros habitantes daquella villa. Expediram-se ordens de captura, e alguns delles foram presos e remettidos para a corte. Eram pessoas abastadas, e um magistrado de Coimbra que fora enviado áquella dilgencia, receiando que os libertassem pelo caminho, mandou-os

  1. «Tandem traditi sunt igni et in Christum D. N usque ad ultimum anhelitum inspirantes, sancto que crucifixo adherentes vitae suae extremum clauserunt diem»: Memoriale, l. cit., f. 15.