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homem que os christãos-novos começaram a achar favor[1]. Suppostas as riquezas delles, a grandeza do perigo e o caracter do núncio, não é fácil de crer que essa protecção fosse gratuita; mas, segundo parece, o astuto italiano soube fingir com arte por algum tempo que não se inclinava nem para uma, nem para outra parte[2].

Um facto, que seria inexplicavel, se naquelles tempos não lavrasse a corrupção tão largamente, como no decurso desta narrativa teremos muitas vezes occasião de notar, veio favorecer mais que tudo os ameaçados conversos. Apesar das cautelas com que Duarte da Paz negoceiava, não lhe tinha sido possivel occultar aos agentes d'elrei o progresso das suas diligencias. Além do embaixador Brás Neto, D. João iii tinha em Roma quem mais

  1. No Memorial dos christãos-novos de 1544 invoca-se mais de uma vez o testemunho do bispo de Sinigaglia sobre as injustiças practicadas contra elles por essa epocha e allude-se, até, á protecção que lhes dava.
  2. E' o que se deduz de ser Sinigaglia quem communicou para Roma o desprazer d'elrei sobre o procedimento da curia quando foi suspensa a bulla de 17 de dezembro. Veja-se a carta de Santiquatro de 14 de março, na G. 2, M. 5, N.° 51.