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de outubro, tractava seriamente de se congraçar com elrei. O caracter cynicamente abjecto deste homem revela-se plenamente na carta que para tal fim dirigiu a D. João iii, onde allude a outra que escrevia na mesma conjunctura a um valido[1], na qual se desculpava dos cargos que davam contra elle em Portugal. Dir-se-hia, á vista da insolente familiaridade dessa carta, que o astuto hebreu conhecia assás a inclinação de D. João iii a aproveitar os resultados de occultas delações, systema que até aqui temos visto empregado sempre por elle contra os cristãos-novos. Porventura, o proprio Duarte da Paz já teria antes de sair do reino exercido o repugnante mister d'espia. Leva-nos, pelo menos, a suspeitá-lo, não só a confiança com que falava, mas tambem uma phrase daquella singular missiva[2]. Ahi, o procurador dos conversos

  1. «Eu escrevo ao conde (talvez o da Castanheira) muito verdadeiramente quam pouca culpa tenho em nenhuma das cousas que ma dão». Curta de Duarte da Paz a elrei de 4 de novembro de 1532, recebida em Évora a 19 de dezembro por via de Alvaro Mendes embaixador juncto a Carlos v}: Corpo Chronol., P. I, M. 49, N.° 20.
  2. sempre estou, como estava nesse reino, prestes a serviço de V. A».