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rei não era manter a pureza e integridade da fé nos proprios estados, mas sim verter o sangue de uma parte dos seus subditos mais opulentos, para se apoderar das suas riquezas. O estado da fazenda publica auctorisava esta crença. Não era possivel occultar a miseria do erario; porque já por esse tempo, afóra a enorme divida interna representada pelos padrões de juro, os emprestimos levantados em Flandres eram tão avultados, em relação áquella epocha e aos recursos do paiz, que os juros anuaes desses emprestimos subiam a cento e vinte mil cruzados. Vinham ensombrar este quadro e tornar ainda mais temeroso o futuro, não só as despezas inevitaveis das guerras de Africa, da India e da colonisação e defesa do Brazil; mas tambem o genio desperdiçado d'elrei, que, não contente de augmentar as difficuldades economicas com a manutenção de frades e com obras dispendiosas de conventos e mosteiros, taes como as de Thomar e Belem, desbaratava a fazenda do Estado com mercês de dinheiro, verdadeiramente pródigas, feitas a cortezãos e affeiçoados[1]. Conforme o que era de espe-

  1. Sousa, Annaes, Append. de Doc. p. 401, 404 e segg.