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de todas as leis da decencia e da disciplina ecclesiastica. Foi escolhido o infante para substituir o bispo de Ceuta e reanimar a Inquisição de um lethargo, que não condizia nem com a sua indole nem com os fins para que fora creada[1]. Não podendo exercer elle proprio o officio de supremo inquisidor, D. João iii mostrava, ao menos, bons desejos, nomeiando para o cargo um membro da sua familia[2].

O despeito d'elrei pelas blasphemias affixadas nas portas das igrejas de Lisboa tinha sido legitimo, e justa a punição do culpado, posto que repugnem á humanidade os tormentos e o atroz supplicio que lhe foram applicados. Mas o substituir a um ancião respeitavel um mancebo, ainda na idade das paixões violentas, no tremendo cargo de in-

  1. Carta regia de 22 de junho de 1539, no Colleclorio f. 9 v. e seg. —Sousa, Historia Genealog., T. 3, p. 265 e seg.
  2. Isto que alguem supporia invectiva nossa, di-lo o proprio D. João iii. «Se este carego (o de inquisidor-mór) fora de principe secular com muy grande gosto me empregara nele»: Minuta da carta a D. Pedro Mascarenhas, na G. 13, M. 8, N.° 6, no Arch. Nac.