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seus fins, o enviado português imaginara. Uns certos Correias, que se achavam em Roma, fingiram, de accordo com este, demandá-lo em razão de alguns bens, verdadeiros ou suppostos, em que diziam não dever D. Martinho succeder por ser bastardo. O embaixador negou a excepção, e o papa nomeiou juizes para dirimirem a contenda. O arcebispo accumulou então toda a casta de documentos falsos, e fez instituir quantos inqueritos quiz de testemunhas compradas, com que provou judicialmente que era legitimo. Os registos da curia estavam cheios de supplicas em que por diversas vezes e em differentes epochas D. Martinho reconhecera a sua bastardia e della pedira dispensa ; mas como o processo não passava de uma comedia, nem a parte adversa impugnou as provas, nem os juizes fizeram caso do facto sabido, e a legitimidade do arcebispo foi julgada por sentença[1]. Assim preparado, só restava esperar pela conjunctura de alguma creação de cardeaes, e ter a seu favor os

  1. «ritrovato le falsitá dei leslimonii et dei notarii et le collusioni delle parti»: Ibid. Veja-se o breve Exponi nobis, onde a farça vem longamente descripta.