naquella conjunctura. Um dos christãos-novos que alli primeiramente se prenderam foi o rendeiro do almoxarifado, Gabriel Furtado. Chegou o contador d'elrei para lhe tomar contas; estava preso. Tinham-no fechado numa gaiola de ferro dentro de uma torre, e a gaiola recebia apenas a escaça luz de uma fresta defendida por duas grades tambem de ferro. Dar contas alli era impossivel. A requerimento do agente fiscal, Gabriel Furtado foi conduzido fóra da prisão com guarda á vista, para ser ouvido. O rendeiro do almoxarifado devia, porque tambem lhe deviam. Naturalmente, os contribuintes tinham escrupulisado de pagar os direitos reaes a um judeu, a um hereje encarcerado pelos inquisidores. Ha muitas consciencias timoratas assim. Não obstante, o agente achou uma solução á difficuldade: os bens do preso chegavam para cubrir uma parte da divida; mas faltava completar essa facil solução. Sem apontamentos escriptos, incommunicavel, não podendo recorrer a ninguem para cobrar os impostos, com os bens em almoeda, e reduzido á mendicidade, como pagaria o desgraçado christão-novo o resto da propria divida? Recorreu-se a um arbitrio. Por graça do inquisidor Almada, um tincteiro, uma penna e seis folhas de papel,