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duziam-nos as justiças seculares, e acorapanhava-os a clerezia das duas parochias de Sanctiago e de S. Martinho. Chegados juncto ao cadafalso, cantou-se o hino Vent creator Spiritus. Um frade subiu ao pulpito, e orou. Devia ser o discurso um admiravel tecido de blasphemias. Foi breve o frade; porque a obra talhada para aquelle dia era longa. Começou a leitura das sentenças; primeiro as de degredo e de prisão temporaria, depois as de carcere perpetuo, a final as de morte. Estas eram vinte. Os padecentes, sete mulheres e doze homens, foram successivamente atados ao poste fatal e assados vivos. Uma só mulher pôde escapar ao seu horrivel destino, porque, diz a carta, se mostrou verdadeiramente arrependida, confessando melhor as suas culpas. Além disso, no entender do inquisidor, aquelle acto de indulgencia servia para provar a commiseração e brandura do tribunal. Quanto ao arrependimento dos outros, esse era mais duvidoso. Tinham, em geral, sido relaxados ao braço secular por judaisarem nos carceres. Isto provava quanto era necessaria a inflexibilidade. Advertia o inquisidor que conservava ainda aferrolhada muita gente prestes para servir em igual espectaculo, e que o pejamento das masmorras