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cremos ter satisfeito ao nosso proposito. Forcejámos para que fossem mais os documentos do que nós quem falasse: tambem cremos tê-lo obtido. Nas ponderações que o assumpto exigia, ou para clareza da narrativa, ou para concatenação dos successos, buscámos ser justos com os oppressores e não nos deixarmos prevenir pelo dó dos opprimidos. Precavia-nos contra as fraquezas da compaixão a baixeza dos ultimos na desgraça: a extrema hediondez moral dos primeiros temperava-nos pelo asco quaesquer demasias de odio. Na verdade, uma ou outra vez, o espectaculo da suprema depravação humana, impondo silencio á voz tranquilla da razão historica, impelliu-nos a traduzir num brado de indignação as repugnancias irreflexivas da consciencia irritada. Mas este senão, se é senão, nunca poderá evitá-lo inteiramente o historiador que conservar os sentimentos do homem e tiver de estudar á luz dos documentos, infinitamente mais sinceros que os analystas, um ou diversos periodos da historia do se culo xvi, daquelle seculo corrupto e feroz, de que ainda hoje o absolutismo, ignorante do seu proprio passado, ousa gloriar-se, e que, tendo por inscripção no seu adito o nome obsceno do papa Alexandre vi e por epita-