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curador, como anteriormente vimos, em continuos embaraços, e a falta de recursos, como tambem vimos, crescia á medida que augmentavam as difficuldades. Uma imprudencia de Diogo Fernandes, ou uma cilada habilmente armada acabou de inhabilitá-lo para desempenhar uma commissão que cada dia se tornava mais ardua.

Diogo Fernandes Neto foi accusado perante o papa de apostata e judeu. Procedeu-se contra elle e saíu culpado. Prenderam-no. Cumpria que fossem graves as demonstrações de judaismo dadas por esse homem, a quem a sua situação impunha o dever da circumspecção, para ser preso e processado num paiz onde se tolerava aos sectarios da lei de Moysés a profissão publica das suas crenças. Dizia-se, até, que a fundação do supremo tribunal de fé em Roma tivera em parte por motivo o caso de Diogo Fernandes: ao menos tinham-no assim persuadido a D. João iii, que a isso alludia dous annos depois escrevendo ao papa[1]. Sem fazer grande conceito do

  1. «o qual (Diogo Fernandes) perante vossa santidade culpado em manifesto judaismo, em parte foy causa de vossa santidade na sua cidade de Roma instituir a santa Inquisição»: Minuta citada.