A Ideologia Californiana oferece uma maneira de se entender a realidade vivida por estes artesãos da alta tecnologia. Por um lado, estes trabalhadores essenciais são parte privilegiada da mão de obra. Por outro, são herdeiros das ideias radicais dos ativistas da mídia comunitária. A Ideologia Californiana, assim, simultaneamente reflete as disciplinas da economia de mercado e as liberdades do artesanato hippie. Esse híbrido bizarro só é possível através de uma crença quase universal no determinismo tecnológico. Já desde os anos 60, os liberais — no sentido social da palavra — esperavam que as novas tecnologias da informação fossem realizar seus ideais. Respondendo ao desafio da Nova Esquerda, a Nova Direita ressuscitou uma forma antiga de liberalismo: liberalismo econômico[1]. Em lugar da liberdade coletiva visada pelos radicais hippies, eles defendiam a liberdade dos indivíduos no mercado. Mesmo estes conservadores não conseguiam resistir ao fascínio das novas tecnologias da informação. Nos anos 60, as predições de McLuhan eram reinterpretadas como publicidade das novas formas de mídia, computação e telecomunicações sendo desenvolvidas pelo setor privado. Dos anos 70 em diante, Toffler, De Sola Pool e outros gurus tentaram provar que o advento da hipermídia paradoxalmente envolveria um retorno ao liberalismo do passado[2]. Esta retro utopia ecoou as predições de Asimov, Heinlein e outros

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  1. Há uma considerável confusão política e semântica quanto ao significado de “liberalismo”, nos dois lados do Atlântico. Os americanos, por exemplo, utilizam liberalismo para descrever quaisquer políticas que por acaso sejam apoiadas pelo — supostamente à esquerda do centro — Partido Democrata. Entretanto, como Lipset demonstra, este sentido estreito da palavra esconde a quase universal aceitação do liberalismo em seu sentido clássico nos EUA. Como ele diz: “estes valores [liberais] eram evidentes no século XX pelo fato de que (...) os EUA não apenas não tinham um partido socialista viável, mas também nunca desenvolveram um partido Conservador ou Tory no estilo Bretão ou Europeu”. Ver LIPSET, Seymor Martin. American Exceptionalism: a double-edged sword. New York: W. W. Norton, p. 31-2, 1996. A convergência da Nova Esquerda e da Nova Direita em tono da Ideologia Californiana, portanto, é um exemplo específico do consenso mais amplo em torno do liberalismo anti-estatista enquanto discurso político nos EUA.
  2. A respeito do sucesso de McLuhan no circuito corporativo festivo, ver WOLFE, Tom. E se ele estiver certo?. In: The Pumo House Gang. Londres: Bantam Books, 1968. Sobre o uso de suas idéias por pensadores conservadores, ver BRZEZINSKI, Zbigniew. Between Two Ages: America's Role in the Technetronic Era. New York: Viking Press, 1970; BELL, Daniel. The Coming of the Post-Industrial Society. New York: Basic Books, 1973; TOFFLER, Alvin. The Third Wave. London: Pan, 1980; DE SOLA POOL, Ithiel. Technologies of Freedom. Harvard: Belknap Press, 1983.