O Serro do Jarau[1]
 

A salamanca[2]

I

 

Era um dia...,

um dia, um gaúcho pobre, Blau, de nome, guasca de bom porte, mas que só tinha de seu um cavalo gordo, o facão afiado e as estradas reais, estava conchavado de posteiro, ali na entrada do rincão; e nesse dia andava campeando um boi barroso.

E no tranquito andava, olhando; olhando para o fundo das sangas; para o alto das coxilhas, ao comprido das canhadas; talvez deitado estivesse entre as carquejas — a carqueja é sinal de campo bom —, por isso o campeiro ás vezes alçava-se nos estribos e, de mão em pala sobre os olhos, firmava mais a vista entorno; mas o boi ]barroso, crioulo daquela querência, não aparecia; e Blau ia campeiando, campeiando...

Campeiando e cantando:

“Meu bonito boi barroso,
Que eu já contava perdido,
Deixando o rastro na areia
Foi logo reconhecido.

Montei no cavalo escuro
E trabalhei logo de espora;
E gritei — aperta, gente,
Que o meu boi se vai embora! —

  1. Serro do Jarau — Na Coxilha Geral de Sant’Ana, sobre a linha divisória com a República do Uruguai.
    Fica um pouco ao N. da cidade de Quaraí, em campos da família Assumpção, de Pelotas. É o ponto culminante (...metros) daquela zona, sendo avistado de muito longe. No fim da guerra do Farrapos (1845) notaram-se sobre o espigão do Serro, e parecendo dele sair, grossos rolos de fumaça. É essa a primeira notícia que há do fenômeno.
    Outras combustões registraram-se depois, notadamente por 1904, em que se disse mesmo que havia expulsão de vapores ígneos.
  2. Salamanca — Furna encantada; provém a denominação da cidade de Salamanca, na Espanha, onde existia, diz-se, uma célebre escola de magia, no tempo dos Mouros. A seguir a tradição local, o célebre caudilho Bento Manoel deveu a sua sorte guerreira, política, de fortuna ao conchavo que ajustou na salamanca do Jarau. Antes dele, alguns, mas depois, nenhum outro aí obteve mais nada, desde — “que o serro pegou fogo” — quando acabou o encantamento.