riquezas, que só comia a caça, o peixe, a fruta e as raízes que Tupã despejava sem conta, para todos, das suas mãos sempre abertas e fazedoras...

Por isso Anhangá-pitã folgou, porque assim minava para o peito dos inocentes as maldades encobertas que aqueles chegados traziam...; e pois, escutando o que eles ambicionavam para vencer a Cruz com a força do Crescente, o maldoso pegou do condão mágico — que navegara em navio bento e entre frades rezadores e santos milagrosos —, esfregou-o no suor do seu corpo e virou-o em pedra transparente; e lançando o bafo queimante do seu peito sobre a fada moura, demudou-a teiniaguá[1]}, sem cabeça. E por cabeça encravou então no novo corpo da encantada a pedra, aquela, que era o condão, aquele.

E como já era sobre a madrugada, no crescimento da primeira luz do dia, do sol vermelho que ia querendo romper dos confins por sobre o mar, por isso a cabeça de pedra transparente ficou vermelha como brasa e tão brilhante que os olhos de gente vivente não podiam parar nele, ficando encandeiados, quase cegos!...

E desfez-se a companhia até o dia da peleja da nova batalha. E chamaram — salamanca — à furna desse encontro; e o nome ficou p’r’as furnas todas, em lembrança da cidade dos mestres mágicos.

Levantou-se um ventarrão de tormenta e Anhangá-pitã, trazendo num bocó a teiniaguá, montou nele, de salto, e veio correndo sobre a correnteza do Uruguai, por léguas e léguas, até as suas nascentes, entre serranias macotas.

Depois, desceu, sempre com ela; em sete noites de sexta-feira ensinou-lhe a vaqueanajem de todas as furnas recamadas de tesouros escondidos... escondidos pelos cauílas, perdidos para os medrosos e achadio de valentes... E a mais desses, muitos

  1. Teiniaguá — Idem: lagartixa. A teiniaguá encantada também era chamada — carbúnculo, farol — e trazia engastada na cabeça “uma pedra preciosa que cintilava como brasa e de cor de rubim...
    Semelhante animal nunca puderam apanhar nem vivo nem morto, porque por suas irradiações desvia os olhos e mãos dos perseguidores”. (Rev°. C. Teschauer, S. J. na Rev. do Instº. do Ceará, 1911).