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Voltado para a Sombra, assim dizia:


«Phantasma d'estes montes, quem és tu?
Em que abysmos de treva e de agonia,
Em que profundidades d'este mundo,
Fôste creado? Ah, dize: não és mais
Que um sentimento trágico da Terra?
E em mysteriosas fórmas espectraes
Perante mim te ergueste, á luz do Sol?
Vens da animica e viva intimidade
Das Cousas? Vens de Deus? Acaso viste
A face imponderavel e infinita
Da Vida? Aquela face eterna e triste!
Ha no teu seio o fogo das estrelas,
Como no corpo rude, tôsco e mudo
Da pedra, ha luz do céu que foi roubada?
Conheces o Principio e o Fim de tudo?
Tu sabes quem eu sou? Responde, fala!
Porque eu entendo as sombras ... Meu amôr
É uma Sombra de espirito que exhala
A formosura eterna em meu espirito!
Quero ouvir tua voz e conhecer
Que mysterios desvenda. Meu desejo
É subir ás estrelas e descer
Aos abysmos phantasticos da Noite!
O meu desejo é Tudo; mas eu sou
Somente um fragil sêr! Quero sondar
As entranhas da Vida! a Treva imensa
Onde tudo se géra, e o grande mar
Nem lagrima é sequer, mas simplesmente
A precursôra comoção das lagrimas...

E onde o sagrado Espirito vivente