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Surpreendido e medroso ... sem saber...
Seus gestos feios e peluda cara
E a luz, já curiosa, dos seus olhos!
E de si proprio atónito, fugiu,
Guinchando horrivelmente pelos bosques!...
Ai, do sêr que, algum dia, descobriu
Essa mortal miseria que o formou!
Mas tambem, n'esse instante de miseria,
Seus olhos mais além se dirigiram,
Alcançando, por fim, a Vida eterea
Que nimba de luar e de esplendor
O tenebroso corpo que a produz,
Vivendo e gravitando em tôrno d'ela:
Ele,—o mundo de dôr e de tormento;
Ela,—a remota, virgem, pura estrela!


E Marános, em scismas embebido
E como distraido, contemplava
As distancias do céu indefinido,
Onde em segredo e sombra os astros nascem...
E as tôscas rochas ingremes dos montes
E os casaes branquejantes e apagados
Que faiscam no pó dos horisontes,
Quando o sol-pôr incide nas vidraças.
O seu gôsto era olhar, isto é, crear;
Converter em profundo sentimento
A espiritualidade azul do ar,
Cores, perfumes, sons, a terra, a nuvem...
De manhã, ia vêr o Sol que nasce,
Quando a neblina em sonhos de brancura
Lhe deixava, fugindo, sobre a face

Lagrimas abrazadas n'um sorriso...