para todos, os que iam dar e os que iam receber a liberdade, e para nós a mais suave de todas as sensações possíveis: a de ver recuar as trevas da escravidão do rosto de uma raça, esse grande fiat lux, ver o barro ontem informe, o escravo, acordar homem, como o Adão de Miguel Ângelo, na claridade matinal da criação... O pensamento voltava quase quatro séculos atrás, à primeira missa dita no Brasil, quando ele tomou o nome de Terra de Santa Cruz... Quatro séculos para a cruz recuperar o seu verdadeiro sentido de símbolo da redenção e para a missa significar o sacrifício de Deus pelo homem!... Vendo diante deles aquela a quem iam dever a liberdade, e olhando para a Senhora da Piedade no nicho do altar, os escravos na confusão dos seus dois grandes reconhecimentos deviam ter sentido os rubis, como lágrimas de sangue, do resplendor da mãe de Deus, baixar um momento sobre a cabeça da sua redentora ajoelhada[1]...”

  1. A senhora a quem me referia era uma compatriota nossa, que casara em Paris com um jovem e elegante russo. Há dela um admirável retrato em tamanho natural, obra de Pistner. A suavidade e doçura de madama Haritoff, a tão popular d. Nicota, emprestavam-lhe uma beleza toda de expressão, com seus longos cabelos pretos, seus grandes olhos luminosos, sua tez de um moreno mate, e a graça de seu corpo, tinha para os estrangeiros um caráter especial, distintamente brasileiro.