mesa, retomou-os, e continuou serenamente a leitura:

"...Conheceis um outro com cara de furão?..."

Olhares de lado fixaram o padre Natário.

"...Desconfiai dele: se puder trair-vos, não hesita; se puder prejudicar-vos, folga; as suas intrigas trazem o cabido numa confusão porque é a víbora mais daninha da diocese, mas com tudo isso muito dado à jardinagem, porque cultiva com cuidado duas rosas do seu canteiro."

— Homem, essa! exclamou Amaro.

— É para que você veja, disse Natário erguendo-se lívido. Que lhe parece? Você sabe que eu, quando falo das minhas sobrinhas, costumo dizer as duas rosas do meu canteiro. É um gracejo. Pois, senhores, até vem com isto! - E com um sorriso macilento, de fel: - Mas amanhã hei-de saber quem é! Olaré! Eu hei-de saber quem é!

— Deite ao desprezo, Sr. padre Natário, deite ao desprezo, disse a S. Joaneira pacificadora.

— Obrigado, minha senhora, acudiu Natário curvando-se com uma ironia rancorosa, obrigado! Cá recebi!

Mas a voz imperturbável do cônego retomara a leitura. Agora era o retrato dele, traçado com ódio:

"...Cônego bojudo e glutão, antigo caceteiro do Sr. D. Miguel, que foi expulso da freguesia de Ourém, outrora mestre de Moral num seminário e hoje mestre de imoralidade em Leiria..."

— Isso é infame! exclamou Amaro exaltado.