tocar. Mas, quando ele prolongava demais as suas manifestações de aplauso ou vinha importuná-los com perguntas, mandavam-no embora tratando-o de desajeitado, dizendo que não podiam compreender como houvesse quem não apreciasse a música.

De tudo isto ia se formando entre os dois uma grande intimidade. Nenê já abandonara completamente os modos cerimoniosos de tratamento e às vezes chegava mesmo a servir-se para com ele desse tu que nivela os terrenos e suprime as distâncias. Depois da execução de cada partitura, quando ainda vibravam-lhes aos ouvidos os acordes sentimentais e tristonhos de Chopin, a moça fitava-o nuns olhos quentes de delírio, como a lhe agradecer aqueles instantes de ventura que lhe tinha proporcionado. Nessa região mística dos sonhos e das fantasias ela lhe permitia uns amplexos de fraternidade artística. E eles juntos iam por ai afora a vogar mansamente, nuns doces enleios lamartinianos, pelos mundos etéreos dos sonhos, absortos nos seus cismares, como que desprendidos da realidade, num idílio murmurado brandamente em linguagem de harmonias. E iam assim através da vida, sonhadores de quimeras com um acordar