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— Isso é uma infamia!

Elle empallideceu terrivelmente; mas a condessa, interpondo-se, com uma voz vibrante:

— Não! sou eu! Sou eu que vou para Alexandria.

— N’esse caso sou eu o infame, prima.

Houve um silencio. Os olhos da condessa estavam humidos. Correu para mim, tomou-me uma das mãos, murmurou entre soluços:

— Que quer? Ninguem tem culpa. Amo este homem, fujo com elle.

Rytmel tomara-me a outra mão.

— Agora, dizia, é impossivel voltar. É um passo dado, irreparavel...

Eu estava succumbido: aquella situação imprevista, deixava-me sem raciocinio, sem voz, sem vontade.

Eu, amigo do conde!... Eu, cumplice d’aquella fuga! Além d’isso, alli, no meio d’aquelles dois amantes encantadores, que me supplicavam apertando-me as mãos, eu sentia-me ridiculo — e isto augmentava o meu desespero. A condessa, no entanto, continuava:

— Primo, disse ella, que importa? Estou deshonrada, bem sei. Mas que queria? que eu ficasse ao lado de meu marido, amando este, n’uma mentira perpetua, vivendo alegremente instalada na infamia? Essa situação nunca! É suja! Ao menos isto é franco. Rompo com o mundo, sou uma aventureira, fico sendo uma mulher perdida, mas conservo-me para um só e sendo pura para elle.

— Captain Rytmel, disse eu, então mande deitar uma lancha ao mar.

— Que quer fazer? gritou a condessa.

— Eu? ganhar a terra. Acha que tambem não é uma infamia installar-me n’este navio?

— Está louco, disse Rytmel, ha só um escaler a bordo. O vento cresce, o mar incha. O escaler não se aguentará dez minutos.

— Melhor! Um escaler ao mar! gritei eu.

— Ninguem se mecha! bradou Rytmel.

E voltando-se para a condessa:

— Mas diga-lhe que é a morte! Que cumplicidade tem elle? Foi forçado, foi levado. Não responde por nada.

— Um escaler ao mar! gritava eu.

Mas, de repente, Rytmel tomando um machado correu ao bordo d’onde pendia o escaler, cortou as correias de suspensão; o barco cahiu na agua com um ruido surdo, ficou jogando sobre as ondas meio voltado, sobrenadando como um corpo morto.