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— Não posso, não posso. Eu morro... Vem para o pé de mim, Betty!...

— Meu Deus, quer-se deitar? diga...

E erguendo os olhos e as mãos, n’uma imploração cheia de dôr, de desespero:

— Deus me leve para si! Ai! nada d’isto era se a mamã fosse viva, minha senhora!

Começou a chorar. Eu olhei-a com uma grande afflicção, senti os olhos humidos, os soluços suffocaram-me, e arremessando-me aos seus braços, chorei, chorei, chorei amargamente, chorei cruelmente, chorei pela saudade, chorei pela traição, chorei pelo meu passado legitimo, chorei pelo encanto dos meus peccados, chorei por me sentir chorar...

IX

 

Soceguei. Vencida, fiquei n’uma chaise longue, muda e como morta. Olhava machinalmente o tremer da luz.

— Betty, disse eu, deita-te. Eu estou bem. Vae...

Ella saiu, chorando. O quarto estava mal allumiado. Eu via, fóra, as ramagens do jardim, recortando-se n’um relevo negro sobre o pallido ceu, cheio da lua. Estive muito tempo assim, olhando, sem consciencia e sem vontade. Lentamente, creio, comecei pensando em cousas alheias aos interesses da minha dôr: lembrava-me a fórma d’um vestido que eu tinha desenhado para a Aline.

Por fim ergui-me, passeei muito tempo no quarto, o movimento chamou-me á consciencia e á verdade das minhas afflicções. Arranquei a folha d’uma carteira, e escrevi a lapis tumultuosamente: «Tem rasão, tem rasão. Espero-o ámanhã ás 10 horas da noite na casa... Até lá não lhe direi que o amo; só lá lhe direi o que soffro.»

Eu mesma saí ao corredor, e do alto da escadaria, silenciosa, allumiada por um grande globo fosco, chamei um criado, André, imbecil e indiscreto, e atirei-lhe o bilhete lacrado, dizendo-lhe:

— Leve esse bilhete já... Vá n’uma carruagem.

E indiquei-lhe a casa de meu primo. Rytmel estava hospedado lá.