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Eu tinha interesse em ficar á mesa defronte da luminosa Carmen, concentrei-me sobre o meu prato. O capitão tinha tomado logo o seu excentrico chapeu indio, orlado de veus brancos.

Ao vel-o seguir a condessa, a hispanhola empallideceu. Momentos depois ergueu-se tambem, tomou uma larga capa de seda á maneira arabe de um bournous, enrolou-a em roda do corpo, e subiu para a tolda, apoiada n’uma alta bengala de castão de marfim.

O almoço tinha acabado. Fallava-se da India, do theatro de Malta, de lord Derby, dos Fenians; eu enfastiava-me, fui apertar a mão ao commandante, e fumar para cima um bom charuto, sentindo a brisa fresca do mar.

A condessa estava sentada n’um banco á pôpa; ao pé d’ella o capitão Rytmel, n’um pliant de vime.

Carmen passeava rapidamente ao comprido da tolda; ás vezes, firmando-se nas cordagens, subia o degrau que contorna interiormente a amurada, e ficava olhando para o mar, emquanto a sua mantilha e a sua capa se enchiam de vento, e lhe davam uma apparencia ondeada e balançada, que a assimilhava áquellas divindades que os esculptores antigos enroscavam no flanco dos galeões!

IV

 

D. Nicazio Puebla, que o Purser me apresentara já, viera fumar para o pé de mim.

— Esteve na India, Caballero? perguntei-lhe eu.

— Dois annos, em Calcuttá. Foi lá que conheci o capitão Rytmel. Conviviamos muito. Jantavamos sempre juntos. Fui á caça do tigre com elle. Cacei o tigre. Deve ir a Calcuttá! Que palacios! Que fabricas!

— O capitão é um valente official.

— É alegre. O que nós riamos! E bravo, então! Se lhe parece! Salvou-me a vida.

— N’alguma caçada.

— Eu lhe conto.

Tinhamo-nos approximado da pôpa, fallando. N’este momento vi eu a hispanhola encaminhar-se para o logar em que a condessa fallava com Rytmel, e com uma resolução atrevida, a voz altiva, dizer-lhe: