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é um só pavão quem faz isso; o mesmo succede no fragmento de um fabulario provençal publicado na Romania, III; vid. p. 292, nota. Neste ponto O Livro de Esopo está mais proximo de Phedro-Romulo do que de Walter. Alem d’esta differença entre o nosso texto e o de Walter, nota-se que o lat. graculus foi traduzido por corvo, o que tambem se observa no mencionado fragmento provençal e noutros fabularios medievaes: vid. Romania, loc. cit.

Na fab. XXIV o lobo accusa de divida a raposa perante o bogio. Em Walter, n.º 38, como noutros fabularíos (Isopet I, Izopet de Lião), a raposa é accusada de furto.

Na fab. XXV a dóninha promette ao homem, em troco de este lhe conceder a vida, guardar de ratos a casa no futuro. Em Walter, fab. 39.ª, a dóninha diz ao homem que lhe guardou de ratos a casa, e pede-lhe, em compensação, que a poupe. No latim a resposta do homem contrapõe-se ao pedido, pois é: guardaste-me a casa de ratos, mas foi no teu interesse, pois os comias, e tambem comias o que era meu. No português a resposta é como se o pedido fosse formulado (do mesmo modo que no latim) quanto ao passado, e não quanto ao futuro.

Na fab. XXVI o boi pisa a rã, e esta assanha-se para se bater com elle, dialogando depois com a filha. Em Walter, como em Phedro, I, XXIV, a rã tenta bater-se com o boi por inveja, e o dialogo é com um filho. Mas em Horacio, Satirae II, III, 313, um bezerro pisa os filhos da rã:


Absentis ranae pullis vituli pede pressis


Na fab. XXVII ha uma abreviatura, Sors., que interpretei por «senadores», aventando porém, em nota, que tambem alguem poderia entender «senhores». Curioso é notar gue no Yzopet de Lião, v. 2186, se diz: Li senatour et li proudome. No Isopo Riccardiano: «lo signore di Roma»[1].

Na fab. XXVIII ha um dialogo preliminar entre o cavallo e o leão, em que aquelle diz que é muito doente. Este dialogo falta em Walter.

Na fab. XXXII o lobo furta um bode e come-o num silvado; a raposa diz ao pastor que o lobo lhe havia furtado o bode. Em Walter, fab. 46.ª, não se menciona expressamente «bode», só praeda e cibus, e o lobo está num antro.

  1. Ghivizzani, parte II, p. 102.