[Fl. 33-r.][C]omta o doutor[1] este emxenplo, e diz que hũu judeu queria passar pella terra de hũu rrey com muyto aver que comssiguo leuava; e rrogou a el-rrey que lhe désse hũu de ssua casa que o aconpanhasse sseguro, ataa que passasse sseu rreygno. El-rrey lhe deu hũu sseu scudeyro, do quall sse fiava muyto; e mandou-lhe que acompanhasse este judeu bem e ffiellmente, ataa que o passasse em ssaluo fora de ssua terra.
E quando este judeu foy em hũa mata, o escudeyro tirou fora de ssua espada pera o matar e rroubar-lhe sseu aver; e ho judeu lhe disse:
— Nom me mates, porque, sse me matas, aquellas perdizes que estam em aquella aruor te acusarom a teu ssenhor, e mandar-t’á matar.
O escudeyro escarneçeo do que o judeu dizia, e matou-ho, e tomou-lhe todo sseu aver que comssyguo leuaua.
E d’aly a pouco tempo pressemtarom a este rrey perdizes, sseendo a jantar. Este sseu scudeyro cortaua amte ell; e como a Deus prouue, compeçou este escudeyro de rryr, e nom sse podia teer nem fartar de rryr. Ell-rrey sseendo aa mesa nom lhe disse nada, e depoys que jantou, chamou-o a de parte, e porque rria tam fortemente aa mesa[2] que lhe dissesse a verdade. Ho escudeyro nom lh’o queria dizer, que sse temya. Elrrey[3] /[Fl. 33-v.] amtre afaaguos e ameaças ssoube d’ell a verdade, em como matára aquell judeu e lhe tomára todo sseu auer, e que o judeu, amtes que o matasse, lhe disera que as perdizes que estauam na aruor [o ac]usariam[4] a elle, e que o mandaria matar. Elrrey tomou d’elo gram nojo, porque amaua muyto o escudeyro:
— Por certo as perdizes te acusarom!
Depoys ouue consselho com sseus comsselheyros:
— O que mereçia este ’scudeyro?
E acordarom todos que morresse na forca.
E assy foy o escudeyro enforcado pelo mall que fezera.
Pe[r][5] este emxemplo o poeta nos amostra que nom façamos humeçidio, nem furto, nem outro graue pecado por cobijça de dinheyros[6], nem escondidamemte, nem manjfestamemte, ca do mal que homem faz, sse em este mundo nom ha peemdemça, ha-a no houtro de Deus, que