[Fl. 39-v.][P]om emxemplo[1] este poeta e diz que hũa vez a terra imchou e algũus vilãaos que hy estauam açerqua ouuerom gram temor e fugirom hy açerqua; e logo a pouca[2] d’ora a terra pario hũu rrato, e os vilãaos que esto bem viam ssegurarom-sse e ouuerom gram [prazer][3].
Per este emxemplo o poeta nos amostra que nom deuemos temer as ameaças porque ssom muytos homẽes que ham mays palauras que obras. Ajnda diz que hũa pequena ameaça faz a muytos homẽes auer gram medo. E diz hũu emxemplo: «Cam que muyto ladra, poucas vezes morde».
[Fl. 40A-r.][P]om emxemplo este poeta e diz que andamdo hũu cordeyro a paçer com outros cordeyros, a madre d’este cordeyro emcomendou sseu filho a hũa cabra. Pouco estando, veo o lobo e chamou este cordeyro dizemdo:
— Filho, uem aquó, que aqui está tua madre que te traz as mamas cheas de leyte; e leixa estar essa cabra fedemte.
E ho cordeyro rrespondeo:
— Eu nom quero hir a ty, nem fazer teu mamdado; mas quero estar com esta cabra, a quall me ama como faz madre a filha, e dá-me do sseu leyte quanto me compre. Eu amo mays estar com esta cabra, e viuer segura, que viuer a teu mandamento, que ssey que me queres matar e comer.
Ouvindo esto o lobo, partio-sse e foy-sse sseu camynho.
Per este emxemplo este poeta nos amostra e diz que a mayor rriqueza que no mund[o] pode see h[a][4] he viuer ho homem sseguro; e no
- ↑ No ms. exemplo, sem m ou til, por engano. A regra é com m ou til.
- ↑ Tambem se poderia lêr pouco, pois o ms. está aqui manchado; mas na fab. LIV lê-se claramente pouca d’ora.
- ↑ Aqui o ms. está delido, e a palavra não se distingue toda; mas quer pelo que resta d’ella, quer pelo sentido, quer porque em fabulas latinas medievaes que correspondem a esta occorre iocus e risus (L. Hervieux, Les fabulistes latins, II2, 328 e 411), não hesitei em pôr prazer.
- ↑ Como está aqui um pedaço da folha roto, a photographia não deixa vêr por completo a palavra que falta; mas distingo restos de lettras que podem corresponder a sse h, pelo que transcrevo sem hesitação sse ha (= «se tem»).