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ella, porque logo lhe não mandei o setim para as mangas, fez de mim mangas ao
demo. Não desejo eu de saber, senão qual he o galante que me succedeo; que se
vo-lo eu colho a balravento, eu lhe farei botar ao mar quantas esperanças lhe
a fortuna tẽe cortado á minha. Ora tenho assentado, que amor destas anda com
o dinheiro, como a maré com a lũa: bolsa cheia, amor em ágoas vivas; mas se
vasa, vereis espraiar este engano, e deixar em sêcco quantos gostos andavão
como o peixe na ágoa.

SCENA II.



Filodemo e Duriano.

FILODEMO.


Ó lá! cá sois vós? Pois agora hia eu bater essas moutas, para ver se me
sahieis de alguma; porque quem vos quizer achar, he necessario que vos tire
como huma alma.

DURIANO.


Oh maravilhosa pessoa! Vós he certo que vos prezais de mais certo em casa,
que pinheiro em porta de taverna; e trazeis, se vem á mão, os pensamentos com
os focinhos quebrados, de cahirem onde vós sabeis. Pois sabeis, Senhor
Filodemo, quaes são os que me mátão? Huns muito bem almofaçados, que com
dois ceitis fendem a anca pelo meio, e se prezão de brandos na conversação,
e de fallarem pouco e sempre comsigo, dizendo que não darão meia hora de
triste pelo thesouro de Veneza; e gábão mais Garcilasso