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Deo o triste pastor fim a seu canto:
Co'o rosto baixo e alto o pensamento,
Seus olhos começárão novo pranto:
Mil vezes parar fez no ar o vento,
E apiedou no ceo o coro santo:
As circumstantes sylvas s'inclinárão,
Condoidas das mágoas qu'escutárão.
  Com hũa mão na face, reclinado,
Tão enlevado em sua dor estava,
Que, como em grave somno sepultado,
Não via que ja o sol no mar entrava.
Berrando andava em roda o manso gado,
Que o seguro curral ja desejava:
Nas covas as raposas, e em seus ninhos
Se recolhem os simples passarinhos.
  Ja sôbre hum sêcco ramo estava pôsto
O mocho com funesto e triste canto:
Ao som delle o pastor ergueo o rosto,
E vio a terra envolta em negro manto.
Quebrando então o fio de seu gôsto,
E o fio não quebrando de seu pranto,
Por não se descuidar de seu cuidado,
Levou para os curraes o manso gado.{212}