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ORIGEM DAS ESPÉCIES

Examinemos agora o que se passa no estado de natureza, Quando uma parte se desenvolve de um modo extraordinário numa espécie qualquer, comparativamente ao que é a mesma parte nas outras espécies do mesmo género, podemos concluir que esta parte sofreu enormes modificações desde a época em que as diferentes espécies se desligaram do antepassado comum deste género. É raro que esta época seja excessivamente afastada, porque é muito raro que as espécies persistam durante mais que um período geológico. Grandes modificações implicam uma variabilidade extraordinária e continuada por muito tempo, de que os efeitos se tenham acumulado constantemente pela selecção natural com vantagem para a espécie. Mas como a variabilidade da parte ou do órgão desenvolvido de modo extraordinário foi muito grande e muito contínua durante um lapso de tempo que não é excessivamente longo, podemos esperar, em regra geral, encontrar ainda hoje mais variabilidade nesta parte que nas outras partes do organismo, que ficaram quase constantes desde uma época bem mais remota. Ora, estou convencido que esta é a verdade. Não vejo razão alguma para duvidar de que a luta entre a selecção natural com a tendência à regressão e à variabilidade, não cesse no decurso do tempo, e que os órgãos desenvolvidos o mais anormalmente possível, se não tornem constantes. Também, segundo a nossa teoria, quando um órgão, por mais anormal que seja, se transmite quase no mesmo estado a muitos descendentes modificados, a asa do morcego, por exemplo, este órgão devia existir, quase no mesmo estado, numa época recuada, e terminou por não ser mais variável do que qualquer outra conformação. É sòmente nos casos em que a modificação é comparativamente recente e extremamente considerável, que devemos esperar encontrar ainda, num alto grau de desenvolvimento, a variabilidade generativa, como poderia chamar-se-lhe. Neste caso, com efeito, é raro que a variabilidade se tenha fixado pela selecção contínua dos indivíduos variando gradualmente e no sentido desejado, e por exclusão contínua dos indivíduos que tendem a regressar a um estado mais antigo e menos modificado.

OS CARACTERES ESPECÍFICOS SÃO MAIS VARIÁVEIS QUE OS CARACTERES GENÉRICOS

Pode aplicar-se ao assunto que nos vai ocupar o princípio que acabamos de discutir. É notório que os caracteres específicos são mais variáveis que os caracteres genéricos. Cito um