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ORIGEM DAS ESPÉCIES

fas, há duas uniões que chamaremos uniões legítimas, que são muito fecundas, e duas uniões que classificaremos de ilegítimas, que são mais ou menos estéreis. Nas espécies trimorfas seis uniões são legitimas ou completamente fecundas, e doze são ilegítimas e mais ou menos estéreis.

A esterilidade que pode observar-se nas diversas plantas dimorfas e trimorfas, quando são ilegitimamente fecundadas — isto é, pelo pólen proveniente de estames cuja altura não corresponde com a do pistilo — é variável quanto ao grau, e pode ir até à esterilidade absoluta, exactamente como nos cruzamentos entre espécies distintas. Do mesmo modo também, nestes mesmos casos, o grau de esterilidade das plantas submetidas a uma união ilegítima depende essencialmente de um estado mais ou menos favorável das condições exteriores. Sabe-se, que se, depois de ter colocado no estigma de uma flor pólen de uma espécie distinta, se colocar aí em seguida, mesmo depois de um longo intervalo, pólen da própria espécie, este último tem uma acção tão preponderante, que anula os efeitos do pólen estranho. O mesmo acontece com o púlen das diversas formas da mesma espécie, porque, quando os dois pólens, legítimo e ilegitimo, são depositados no mesmo estigma, o primeiro tem vantagem sobre o segundo. Verifiquei este facto fecundando diversas flores, primeiro com pólen ilegitimo, em seguida, vinte e quatro horas depois, com pólen legítimo tomado de uma variedade de cor particular, e todas as plantas produzidas apresentaram a mesma coloração; o que prova que, ainda que aplicado vinte e quatro horas depois do outro, o pólen legítimo destrói por completo a acção do pólen ilegítimo anteriormente empregado, ou impede mesmo esta acção. Além disso, quando se operam cruzamentos recíprocos entre duas espécies, obtém-se algumas vezes resultados muito diferentes; o mesmo acontece com as plantas trimorfas. Por exemplo, a forma de estilete médio do Lythrum salicaria, fecundado ilegitimamente, com a maior facilidade, por pólen tomado dos estames compridos de forma de estiletes curtos, produziu muitas sementes; mas esta última forma, fecundada por pólen tomado dos longos estames da forma de estilete médio, não produziu uma única semente.

Debaixo destas diversas relações e sob outras ainda, as formas da mesma espécie, ilegitimamente unidas, comportam-se exactamente da mesma maneira como duas espécies distintas cruzadas. Isto me levou a observar, durante quatro anos, um grande número de plantas provenientes de diversas uniões ilegítimas. O resultado principal destas observações é que estas plantas ilegítimas, como se podem chamar, não são perfeitamente