Página:Origem das espécies (Lello & Irmão).pdf/343

INSUFICIÊNCIA DOS DOCUMENTOS GEOLÓGICOS
317

podemos presumir, com toda a segurança, que houvesse migrações devidas a alterações climatéricas ou outras; e, quando vemos aparecer uma espécie pela primeira vez numa formação, há toda a probabilidade para que isto seja uma imigração nova na localidade. Sabe-se, por exemplo, que muitas espécies apareceram nas camadas paleozóicas da América do Norte um pouco mais cedo do que na da Europa, tendo sido necessário provàvelmente um certo tempo a esta migração dos mares da América para os da Europa. Examinando os depósitos mais recentes em diferentes partes do globo, tem-se notado por toda a parte que algumas espécies ainda existentes são muito comuns num depósito, mas desapareceram do mar imediatamente vizinho; ou inversamente, que espécies abundantes nos mares da vizinhança são raras num depósito ou faltam aí absolutamente. É bom reflectir nas numerosas migrações bem provadas dos habitantes da Europa durante a época glaciária, que não constitui senão uma parte de um período geológico inteiro. É bom também reflectir nas oscilações do solo, nas alterações extraordinárias de clima, e no imenso lapso de tempo compreendido neste mesmo período glaciário. Pode, contudo, duvidar-se que haja um só ponto do globo em que, durante todo este período, se tenham acumulado na mesma superfície, e de uma maneira contínua, depósitos sedimentares encerrando detritos fósseis. Não é provável, por exemplo, que, durante todo o período glaciário, se tenham depositado sedimentos na embocadura do Mississipi, nos limites das profundezas que melhor convêm aos animais marinhos; porque sabemos que, durante este mesmo período de tempo, grandes alterações geográficas se realizaram noutras partes da América. Quando as camadas de sedimentos depositadas em águas pouco profundas na embocadura do Mississípi, durante uma parte do período glaciário, forem levantadas, os restos orgânicos que contêm aparecerão e desaparecerão provavelmente a diferentes níveis, em razão das migrações das espécies e alterações geográficas. Num futuro afastado, um geólogo, examinando estas camadas, poderá ser tentado a concluir que a duração média da persistência das espécies fósseis desaparecidas fosse inferior à do período glaciário, posto que tenha sido realmente muito grande, pois que se estende desde muito antes da época glaciária até nossos dias.

Para que se possa encontrar uma série de formas perfeitamente graduadas entre duas espécies desaparecidas na parte superior ou na parte inferior da mesma formação, seria necessário que esta tivesse continuado a acumular-se durante um período bastante longo para que as modificações sempre lentas