Página:Origem das espécies (Lello & Irmão).pdf/356

330
ORIGEM DAS ESPÉCIES

crições que possuímos dos depósitos silúricos que cobrem imensos territórios na Rússia e na América do Norte não permitem concluir que, quanto mais antiga é a formação, tanto mais invariavelmente deve ter sofrido uma desnudação considerável ou um metamorfismo excessivo.

O problema fica pois, por enquanto, inexplicado, insolúvel, pode continuar a servir de sério argumento contra as opiniões emitidas aqui. Farei todavia a hipótese seguinte, para provar que se poderá talvez mais tarde encontrar uma solução. Em virtude da natureza dos restos orgânicos que, nas diversas formações da Europa e dos Estados Unidos, não parecem ter vivido a muito grandes profundidades, e da enorme quantidade de sedimentos de que o conjunto constitui estas poderosas formações de uma espessura de muitos quilómetros, podemos pensar que, do princípio ao fim, grandes ilhas ou grandes extensões de terreno, próprios a fornecer os elementos destes depósitos, devem ter existido na vizinhança dos continentes actuais da Europa e da América do Norte. Agassiz e outros sábios sustentaram recentemente esta mesma opinião. Mas não sabemos qual era o estado das coisas nos intervalos que separaram as diversas formações sucessivas; não sabemos se, durante estes intervalos, a Europa e os Estados Unidos existiam no estado de terras emergidas ou áreas submarinas junto das terras, mas sobre as quais se não formava nenhum depósito, ou enfim como o leito de um mar aberto e insondável.

Vemos que os oceanos actuais, cuja superfície é o triplo da das terras, são semeados de um grande número de ilhas; mas não se conhece uma só ilha verdadeiramente oceânica (exceptuando a Nova Zelândia, se todavia esta se pode considerar como tal), que apresente mesmo um vestígio de formações paleozóicas ou secundárias. Podemos, pois, talvez concluir que, por onde se estendem actualmente os nossos oceanos, não existiam, durante as épocas paleozóica e secundária, nem continentes nem ilhas continentais; porque, se tivessem existido, seriam, com toda a probabilidade, formados a expensas dos materiais que lhes houvessem sido tirados, pelos depósitos sedimentares paleozóicos e secundários, que teriam sido a seguir parcialmente levantados nas oscilações de nível que devem necessàriamente haver-se produzido durante estes imensos períodos. Se pois podemos concluir alguma coisa destes factos é que, onde se estendem actualmente os nossos oceanos, oceanos existiram desde a época mais recôndita de que pudéssemos ter conhecimento, e, por outra parte, que onde se encontram hoje os continentes, existiram grandes extensões de terra desde a época cambriana, submeti-