para ter a glória que as letras dão, sem querer arcar com as dores, com o esforço excepcional, que elas exigem em troca. A glória das letras só as tem, quem a elas se dá inteiramente; nelas, como no amor, só é amado quem se esquece de si inteiramente e se entrega com fé cega. Os samoiedas, como vamos ver, contentam-se com as aparências literárias e a banal simulação de notoriedade, umas vezes por incapacidade de inteligência, em outras por instrução insuficiente ou viciada, quase sempre, porém, por falta de verdadeiro talento poético, de sinceridade, e necessidade, portanto, de disfarçar os defeitos com pelotiquices e passes de mágica intelectuais.

Tendo convivido com alguns poetas samoiedas, pude estudar um tanto demoradamente os princípios teóricos dessa escola e julgo estar habilitado a lhes dar um resumo de suas regras poéticas e da sua estética.

Esses poetas da Bruzundanga, para dar uma origem altissonante e misteriosa à sua escola, sustentam que ela nasceu do poema de um príncipe samoieda, que viveu nas margens do Ártico, nas proximidades do Óbi ou do Lena, na Sibéria, um original que se alimentava da carne de mamutes conservados há centenas de séculos nas geleiras daquelas regiões.

Essa espécie de alimentação do longínquo príncipe poeta dava aos olhos de todos eles, singular prestígio aos seus versos e aos do fundador, embora pouco eles os conhecessem.

O príncipe chamava-se Tuque-Tuque Fit-Fit e o seu poema Parikáithont Vakochan, o que quer dizer no nosso calão — O silêncio das renas no campo de gelo.