OS MAIAS
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acobardava. Abriu quasi a tremer o portão: e mal déra alguns passos estacou, ouvindo ao fundo Niniche ladrar furiosamente. Mas tudo emmudeceu; e da janella do canto, sobre o jardim, surgiu uma claridade que o socegou. Foi encontrar Maria, com um roupão de rendas, junto da porta envidraçada, suffocando quasi entre os braços Niniche que ainda rosnava. Estava toda medrosa, n’uma impaciencia de o sentir ao seu lado: e não quiz recolher logo: um momento ficaram alli, sentados nos degraus, com Niniche que aquietára e lambia Carlos. Tudo em redor era como uma infinita mancha de tinta; só lá em baixo, perdida e mortiça, surdia da treva alguma luzinha vacillando no alto d’um mastro. Maria, conchegada a Carlos, refugiada n’elle, deu um longo suspiro: e os seus olhos mergulhavam inquietos n’aquella mudez negra, onde os arbustos familiares do jardim, toda a quinta, parecia perder a realidade, sumida, diluida na sombra.

— Porque não havemos de partir já para a Italia? perguntou ella de repente, procurando a mão de Carlos. Se tem de ser, porque não ha de ser já?... Escusavamos de ter estes segredos, estes sustos!

— Sustos de que, meu amor? Estamos aqui tão seguros como na Italia, como na China... De resto podemos partir mais depressa, se quizeres... Dize tu um dia, marca um dia!

Ella não respondeu, deixando cahir dôcemente